Já está próxima a estréia da série mais aguardada deste ano, “The Witcher”. Protagonizada por Henry Cavill (“Man of Steel”), a série da Netflix será baseada na série de livros original do autor polaco Andrzej Sapkowski , que escreveu a primeira história de “Witcher” há quase quarenta anos atrás. Os seus romances e contos em torno do caçador de monstros Geralt de Rivia tornaram-se muito populares no seu país natal, a Polónia, assim como em outros países da Europa de Leste; o autor também ganhou vários prémios, incluindo distinções honorárias da European Science Fiction Society e World Fantasy Awards.

No entanto foi há apenas doze anos que Sapkowski vendeu os direitos para a adaptação de sua série Witcher para jogos de vídeo, por uma quantia a rondar os dez mil euros – uma quantia “insignificante”, dado que a CD Projekt Red, o pequeno estúdio polaco que adquiriu esses direitos, tornou The Witcher uma das séries de jogos mais bem-sucedidas do século XXI, tendo vendido mais de quarenta milhões de cópias em todo o mundo até Junho de 2019.

Isto levou a uma desavença peculiar entre Sapkowski e a CD Projekt Red em 2018, uma vez que o autor sentiu que devia receber uma compensação maior do que a quantia que haviam acordado quando vendeu os direitos – mesmo que este tenha admitido anteriormente que não acreditava que os jogos seriam tão lucrativos e que essa crença, juntamente com a má impressão deixadada por tentativas prévias de fazer um jogo do The Witcher, o levou a optar por receber um valor estipulado antecipadamente, em vez de uma percentagem das vendas dos jogos.

A celeuma já foi resolvida de forma amigável, o que é um bom presságio para os milhões de fãs de The Witcher que esperam ansiosamente pelo quarto jogo da série. Por enquanto, eles terão de se contentar com a série Netflix, os spinoffs de Gwent e Thronebreaker – e claro, os livros.

A série Witcher é apenas um exemplo de como as adaptações de jogos tornaram os romances e contos da Europa de Leste populares no Ocidente. Embora as obras de Sapkowski já tivessem recebido bastante reconhecimento na Europa Central e de Leste antes do advento da série de jogos, foram os jogos que elevaram os livros ao estrelato global, apresentando a milhões de jogadores por todo o mundo o trabalho do autor polaco.

E tal como The Witcher, outros jogos também deram exposição aos romances que eles usam. Outro grande exemplo disso mesmo é a série de jogos Metro, baseada no romance Metro 2033 de Dmitry Glukhovsky e as suas sequelas. Situado numa versão pós-apocalíptica de Moscovo, os jogos deram a conhecer Glukhovsky para o mundo inteiro, e o autor russo até colaborou diretamente com os produtores dos jogos na sequela Metro: Last Light – que levou o autor a escrever a terceira entrada da série de livros, Metro 2035.

Gameplay Metro Exodus

Como Metro, o jogo S.T.A.L.K.E.R .: Shadow of Chernobyl também se desenrola numa realidade alternativa pós-apocalíptica. Foi elogiado pelo seu design e pela atmosfera sinistra e sombria, capturando a essência e o terror de um complexo decadente de Chernobyl com os seus habitantes mutantes. O jogo é baseado na obra Stalker, dos autores russos Boris e Arkady Strugatsky, um romance baseado no filme de Andrei Tarkovsky com o mesmo nome, que por sua vez é baseado num romance anterior dos irmãos Strugatsky, Roadside Picnic. É uma cadeia de eventos que levou o público de todo o mundo a ler os romances dos irmãos Strugatsky e a assistir ao filme de Tarkovsky.

Até vencedores do Prémio Nobel, como o romancista polaco Henryk Sienkiewicz, beneficiam (a título póstumo, neste caso) da exposição que os jogos oferecem aos seus livros. Embora mais conhecido internacionalmente pelo seu romance Quo Vadis – que contou com um review da Biblion na sua 10ª edição – e a sua épica adaptação de 1951 para as telas de cinema, Sienkiewicz é mais popular na sua terra natal pela sua trilogia de romances históricos baseados nos tempos da República das Duas Nações. A TaleWorlds Entertainment, criadora do RPG Mount and Blade, lançou uma versão “standalone” do jogo intitulada Mount and Blade: With Fire and Sword, que é baseada na trilogia de Sienkiewicz, especialmente nos dois primeiros livros, A Ferro e Fogo e O Dilúvio. O jogo foi louvado pela sua recriação de personagens históricos e de lugares, facções e eventos descritos nas obras.

Combat gameplay Mount and Blade: With Fire and Sword

As adaptações de romances para jogos não são nada fora do comum, mas o impacto que tiveram em aproximar a literatura da Europa de Leste ao público global não pode ser menosprezado. Embora esta não seja uma fórmula infalível para obter sucesso comercial ou aclamação crítica na indústria de jogos, o uso de romances como base para jogos geralmente tem um efeito positivo tanto nos jogos como nos romances – para não dizer em nós mesmos, os jogadores e leitores que amam quando um bom jogo nos leva a um livro igualmente bom e do qual nunca ouvimos falar antes.


About the Author:

Daniel T. Gomes is a graphic designer and content writer from Lisbon, Portugal. He currently serves as Biblion’s Assistant Editor, having played a crucial role in the magazine since its inception. He is also a self-published author and one of the hosts of the biweekly Broklahomies Podcast.